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Menon

"O que vão dizer de nós lá fora?" é o novo mantra dos derrotistas e servis

Menon

19/05/2014 11h54

O "imagina na Copa" está aposentado. Deu lugar ao "já pensou o que vão dizer de nós lá fora". Saiu o pessimismo exacerbado e entrou em campo o servilismo atávico.

É aceitável o "imagina na Copa". Reflete as incertezas diante dos desafios enormes da realização de um Mundial. A última vez que o fizemos, há 64 anos, foi tudo bem, mas as exigências mudaram e agora tudo é mais difícil.

Então, o "imagina na Copa" era a vocalização de nossas angústias. De quem gostaria que tudo fosse bem. Que passássemos no teste. E refletia também aqueles que gostariam que não passássemos no teste, que tudo desse errado.

Por que? Dois motivos. Uns, por serem contra o governo. Como são de outro partido, querem carimbar em Lula e Dilma o carimbo do fracasso. É o mesmo que torcer para não chover, para que falte água e que Alckmin seja identificado como mau gestor. Os outros adotaram o mantra do "imagina na Copa" por aquele sentimento de inferioridade que grassa em setores do País. Nascemos para ser pobre, para ser exportador, para aplaudir, para admirar. Só podemos ser coadjuvantes, nunca protagonistas. Então, a Copa daria errado por definição. Teria que dar errado.

É cruel. É o "esse não é o nosso lugar, para que ficar sonhando com essas coisas, vamos ficar na nossa". Nossa insignificância.

Uma tentativa de comparação: a família pobre e humilde nunca teve um filho na Universidade. O pai é porteiro no prédio e a mãe, diarista. A filha se forma e no dia do baile, aparecem problemas triviais como o vestido da mãe que não serve, como o terno alugado do pai que ficou caro demais, como será  encontrar a família do futuro genro, muito rica… A mãe, desesperada, diz: "por que tudo isso, aqui não é nosso lugar, podia ter se contentado com o que temos…".

Bem, os derrotistas e pessimistas não estão convencidos de nada. Não abandonaram o "imagina na Copa" por algum surto de boa vontade ou por verem algo de bom na Copa. Nada disso. Deixaram o mantra de lado porque a Copa chegou. Então, é hora de "imagina o que vão dizer de nós lá fora".

Longe de mim ser um analista da sociedade brasileira ou algo assim. É muito difícil. Mas, pelas viagens e pela experiência que a idade traz (trocaria na hora pela impetuosidade da juventude) posso dizer que nenhum país do mundo cultiva essa necessidade de agradar os estrangeiros. De saber qual a opinião dos outros sobre nós. A necessidade de agradar dá lugar ao desprezo.

Há poucos meses, Pepe Mujica, presidente do Uruguai, fez um discurso memorável na ONU. Em espanhol, sua língua natal. Para muitos brasileiros, não interessa o que nosso presidente – seja quem for – diz ao mundo. Interessa é se ele falou em inglês ou não. "Imagina o que vão dizer de nós lá fora", não temos um presidente poliglota.

O Brasil tem carências enormes. Eu acho normal, afinal somos um país jovem, mas isso não interessa aqui. As carências do Brasil – para mim, são umas, para vocês podem ser outras, completamente diferentes – são preocupantes e devem ser enfrentadas. Com Copa ou sem Copa, devemos criticar, lutar para que melhoremos, mas, no que me concerne, pouco me lixo para o "que vão dizer de nós lá fora".

Há uns dois meses, me ligou um colega da Colômbia. A conversa foi mais ou menos assim:

– Como estão os preparativos para a Copa?

Estão indo bem, dentro do possível. Tivemos atrasos, mas tudo vai dar certo.

– Mas vai haver Copa em Curitiba?

As obras estão 91% prontas. O dinheiro para o restante foi liberado agora vamos para a conclusão.

– E vai haver Copa no estádio do Corinthians?

Sim, as obras estão 97% prontas. Em breve, haverá o primeiro jogo-teste. Tudo vai dar certo, pode ficar tranquilo.

– Mas houve morte de operários.

Sim, infelizmente esse é um problema brasileiro, temos pouca segurança em obras civis, a Copa talvez sirva para que as autoridades abram os olhos para isso..

– E a segurança, vai ser possível andar pelas ruas do Brasil?

(Perdi a paciência)

Meu amigo, eu cobri a Copa América na Colômbia em 2001. Fiquei em Cali. Havia tanques do Exercito em volta do estádio. Fui ao cinema e havia um lugar para se deixar revólveres antes de entrar. Na farmácia, havia um segurança particular com fuzil. Havia atentados, tentativa de sequestro. Então, eu vou ter medo de segurança no Brasil? Se eu sobrevivi aí, você vai passar muito bem aqui.

Assim será meu comportamento. Vou ajudar todo estrangeiro que estiver aqui no Brasil. Do mesmo modo que ajudo todo brasileiro. Mas não vou ficar aumentando nossas dificuldades, não vou ampliar nossos erros. Isso é problema meu, sofro com eles e dou minha contribuição a quatro anos votando com amor e isenção. Eu sei o nome de todos os deputados em quem votei, desde 1972.

Não me interessa "o que será que vão dizer de nós lá fora" mesmo porque a maioria dos turistas não está interessado em nossos defeitos. Quer curtir a copa, quer tomar guaraná, suco de maracujá, caipirinha, cerveja, experimentar feijoada, ver uma roda de samba, namorar… Querem aproveitar a Copa, o maior evento esportivo do mundo, querem intercâmbio cultural, querem fazer amizade. Eles não querem saber de brasileiros derrotistas e servis.

Mas, enfim, se algum ficar me importunando, ficar questionando minúcias, já tenho algumas respostas à pergunta síntese: "é possível ter Copa no Brasil".

Sim, errado foi ter Olimpíada no seu país em 1936, com Adolf Hitler se negando a entregar medalha de ouro para Jesse Owens, um negro.

Sim, errado seria fazer no seu país, onde a polícia matou o brasileiro Jean Charles e deu a justificativa de que ele parecia um árabe. Por falar nisso, vocês ainda não descobriram quem foi Jack, o Estripador, e não podem falar em segurança.

Sim, tenho certeza que não haverá bombas como na Maratona de Boston. E nossa final será no Maracanã e não em um campo adaptado da NFL, como em 94.

Sim, aliás como está alto o desemprego em seu país, não? Ah, e quando vocês vão fazer uma seleção sem estrangeiros, só com espanhóis?

Mas, repito, não precisarei expor minha falta de educação. Os estrangeiros não são chatos como os brasileiros que só pensam "aí, meu Deus, o que será que vão dizer de nós lá fora".

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.