Vou sentir muita falta de Rogério Ceni, um gênio construído à base de suor
Rogério Ceni não é o maior jogador da história do São Paulo. Como compará-lo a Leônidas da Silva, artilheiro da Coa de 38, a Gérson de Oliveira Nunes, a Pedro Roca, Mauro Ramos, Sastre, Raí, Muller, Sastre ou Bauer, o Monstro do Maracanã?
Rogério Ceni não é mais goleiro do que Zetti.
Rogério Ceni não é um ídolo para mim. Há muito não tenho ídolos. O último foi Diego Armando.
Rogério Ceni tem posições políticas desprezíveis, segundo o meu modo de entender o mundo. E isso é totalmente irrelevantes. Se deixasse que nossas divergências influenciassem meu trabalho, seria um canalha e não um jornalista. Calma, sei que uma palavra não é antônima da outra.
Com tantos senões, por que me emociono a cada nova partida de Ceni? Por que a contagem regressiva de sua carreira me afeta? Por que fico triste com a sua retirada em, no máximo, 13 jogos?
Um dos motivos é que vejo a história terminando. O jornalista tem o privilégio de contar a história. Parte dela, é lógico. Uns estiveram na queda das torres gêmeas, outros na queda da Ditadura, alguns no Vietnã, Normam Mailer escreveu uma livro sobre Ali x Foreman, Ryszard Kapuscinski escreveu A guerra do futebol, sobre o conflito entre Honduras e El Salvador, iniciado após uma partida de futebol, muitos viram Pelé, e eu, entre outras coisas vi Rogério Ceni.
Vi o início, o meio e estou agoniado com o fim. É um capítulo que se fecha. Ficará a lembrança. Como esquecer o frio que fazia em Yokohama no final de 2005, quando Ceni fez a maior partida de um goleiro vestindo a camisa do São Paulo? Nunca vi um goleiro fazer uma partida tão perfeita e tão espetacular – no sentido de espetáculo – como aquela. Vocês podem citar alguns exemplos, mas eu não vi.
Garanto que foi mais do que Banks contra o Brasil em 70, foi mais que Leão contra a Holanda em 74, foi mais do que Zetti contra o Palmeiras em 94, foi mais do que Marcos contra a Alemanha em 2002, foi mais do que tudo.
E o jogo contra o Rosario Central, em uma Libertadores? Ceni precisava defender um penalti e acertar o outro. Um após o outro. Não me lembro a ordem, mas ele fez as duas coisas.
Ceni foi um revolucionário. A soltura de bola, a alta qualidade com os pés e a alta qualidade nas cobranças de faltas. Um goleiro com 123 gols marcados é algo que ficará na história do futebol mundial. É algo eterno.
Admiro Ceni por ser um grande goleiro, por ser um goleiro espetacular, por ser um goleiro revolucionário. E admiro também por ser um profissional correto. Um sujeito que trabalha muito, que trabalha com dedicação, que treina para aprimorar suas qualidades. Ninguém faz tantos gols por decisão divina. A cada bola no ângulo, caindo rapidamente, como um míssil teleguiado, há baldes de suor. Há dedos doendo. Há o aborrecimento da repetição. Uma, duas, três, cem…. até sair um gol. O gol.
Quando um trabalhador com tantas qualidades, misto de talento e dedicação, se afasta, o futebol é que sofre. O futebol chora. E quem tem a veleidade de se achar um contador de histórias do futebol, um qualquer coisa que registra para o futuro as maravilhas do presente, também chora. Quase.
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