Topo

Menon

Futebol nos tempos da cólera

Menon

28/01/2019 16h56

No ano passado, um soldado da PM de Goiás foi ao aeroporto fazer a segurança do Goiás, que voltava à capital após conquistar o acesso à Série A. Trabalhou com firmeza e respeito e terminou dançando com a torcida. Timidamente. Nada de exagerado. Foi punido.

No domingo, 27 de janeiro, um soldado da PM de Pernambuco jogou gás de pimenta em torcedores do Sport que comemoravam a vitória de seu time. Nada de agressividade, nada de tentativa de invadir em campo, nada. Apenas alegria. O soldado deve ser premiado.

E então?

Quem mandou o soldado agir assim? O comando da PM? A Federação Pernambucana de Futebol? Ou ele é apenas fruto de um treinamento em que a repressão é o foco, principalmente quando se trata de uma manifestação popular. Política e futebolística.

No mesmo dia 27, enquanto corpos eram tirados da lama de Brumadinho, enquanto mulheres esperavam uma notícia – mesmo que fosse a constatação da morte – de seu marido, enquanto mães rezavam por uma notícia de filhos, enquanto maridos choravam por esposas mortas, a bola rolava, a 60 quilômetros dali em um indecente Galo x Cruzeiro. Total despreocupação, total falta de respeito e solidariedade. O show deve continuar.

O futebol brasileiro vive tempos de ódio. A torcida do São Paulo, que praticamente expulsou Kaká, Luís Fabiano, Casemiro e Maicon do time, foi ao instagram ofender Pablo e Volpi, jogadores com um mês de clube.

Torcedores do Corinthians ofenderam Gustagol porque ele elogiou Rogério Ceni, seu treinador no Fortaleza.

Não há respeito algum. Torcedores são chamados de bambis, gambás, porcos. Goleiro é bicha.

Mulambo, urubu….

Jogador faz um gol e não pode tirar a camisa para comemorar. Cartão amarelo. Árbitros se comportam como autoridade máxima do jogo. Não estão ali para arbitrar, estão ali para colocar ordem na partida. Piscou, olhou feio, está expulso.

Em tempos de Ditadura (não é o caso) o que pega o cidadão comum é o guardinha da esquina. Ele se acha o general do pedaço. E tome autoritarismo. Síndico de prédio também é assim, picado pelo gene da brutalidade.

Futebol precisa ser algo lúdico, alegre, quase infantil, apesar de ser jogado por crianças milionárias.

Futebol não combina com autoritarismo, apesar dos coronéis nunes, almirantes helenos, majores marinhos etc etc.

Futebol não combina com cólera, ira, raiva.

Nem o Brasil.

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.