Felipão, a Brasília velha e a Ferrari nova
Brasil e Chile se enfrentavam ali na minha frente, na tela plana da televisão HD e eu só pensava na minha cardiologista. Não que ela seja bonita ou que o jogo tenha trazido emoções além da conta – muito pelo contrário – a um velho coração. Nada disso. Eu me lembrava do que ela disse quando exigiu que eu mudasse o remédio que mantém a pressão arterial controlada. "Está ultrapassado. É uma Brasília velha e esse que estou receitando é uma Ferrari novinha, de última geração".
O Brasil de Scolari é uma Brasília velha. Mais do que isso. Além de ser feio e ultrapassado, não funciona. O piloto tem a ver com isso. Os resultados mostram que o melhor momento de Felipão já passou. O campeão do mundo de 2002, o homem que levou Portugal ao vice-campeonato da Eurocopa (ótimo resultado, vamos deixar de lado que a derrota final foi para a GRÉCIA, em casa) e o quarto lugar de Portugal em 2006 perdeu o rumo.
Fracassou no Chelsea, foi para o Uzbequistão (não sei se ensinou algo mas com certeza não aprendeu, pois não havia o que aprender), ganhou a Copa do Brasil com o Palmeiras e, quando tudo parecia voltar ao normal, foi demitido porque o time não conseguia deixar a zona de rebaixamento.
Felipão não é o mesmo? É o mesmo. E aí é que reside o problema. Desde os tempos do Grêmio, Scolari nunca foi um treinador famoso pela inventividade, pela modernidade. Nunca se ouviu que tivesse feito algum time com dois volantes como Mazinho e César Sampaio (obra de Luxemburgo no Palmeiras) ou Cerezo e Falcão (assinatura de Telê na seleção).
Com ele, não. O que se tem é jogadores fazendo funções específicas. O Grêmio de Felipão sempre foi o Grêmio de Paulo Nunes e Jardel. Um 7 e um 9, como dizia Osvaldo Brandão. Volante tem de marcar. Tem de pegar. A todo custo. Vocês se lembram de suas instruções, no Palmeiras, para a marcação sobre Edílson, que estava no Corinthians? "Será que não tem ninguém para dar uma cuspida nele", perguntava no vestiário. Foi gravado.
Jogadores em posições específicas, sem ousadia e muito ligados no jogo. Todos por um e um por todos. É a Família Scolari em campo. Foi o que conseguiu em 2002, quando deixou Romário por aqui e apostou, com muito êxito, no trio Roberto Carlos, Rivaldo e Ronaldo.
Fazer grandes jogadores renderem é o mérito de Felipão. Por isso é tão agradecido a Cristiano Ronaldo, que considera "mais espetacular" do que Messi. Não é. É possível achar que Cristiano é melhor que Messi. Ele tem qualidades técnicas para convencer pessoas a dizerem isso. Mas "espetacular" é outra coisa. Coisa que Felipão não sabe. Ele é o rei da eficiência, do jogo truncado, da bola aérea, dos meninos bonzinhos e dos meninos maus que se tornam bonzinhos sob seu comando.
Tudo isso é importante, mas não é suficiente no momento atual. O Brasil que saiu vaiado de campo após o empate contra o Chile joga um futebol ultrapassado. São volantes que não apoiam. São meias que não voltam. Não há rotatividade, não há conjunto, os compartimentos são estanques.
Não pode haver dúvidas entre o móvel Pato e o poste Damião.
Não pode haver dúvidas se Ronaldinho Gaúcho e Kaká podem estar na mesma convocação. Não digo no mesmo time, Scolari tem o direito de não querer, mas qual o problema em convocar? Em fazer com que as coisas funcionem? Em treinar muito para que os craques possam jogar?
Scolari na seleção me assusta. Porque não há mais Ronaldo, não há mais Rivaldo, não há mais Roberto Carlos, não há mais Romário para ser desprezado. A safra é ruim e é difícil montar um time a partir de individualidades. Esse é o mérito de Scolari e sua família. O Brasil precisa de mais. O Brasil merece mais.
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