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Come-Fogo, uma linda história, ganha um livro fundamental

Menon

22/08/2013 13h25

Comercial, o Leão, e Botafogo, a Pantera, ambos de Ribeirão Preto, fazem, com seu Come-Fogo, cheio de rivalidade, uma página bonita da história do futebol brasileiro. Futebol que cria ídolos como Sócrates, Raí, Piter, Paulo Bim, Jair Bala, Aguillera e tantos outros, que leva vizinhos a não se cumprimentarem, tem sua importância sim, por mais que os torcedores de sofá prefiram ver a segundona da Transilvânia.

Igor Ramos, jornalista de 40 anos, conta essa história cheia de lances dramáticos, bem humorados, covardes e heroicos. É futebol, não? E ao contar a história, ele a modifica. Uma pesquisa árdua, com três anos de duração, o levou a descobrir três jogos que nunca haviam sido contabilizados. Assim, o primeiro Come-Fogo passa a ser de 1929.

Abaixo, algumas estórias desta grande história

O primeiro gesto de fair play do Brasil 

 

O termo é novo e o gesto de cordialidade com o adversário passou a ser  politicamente correto no esporte contemporâneo. Mas este espírito esportivo, de  

jogo  limpo,  também  fez  história  no  clássico  de  Ribeirão  Preto  em  plenos anos  50   contrariando a tese de que a invenção do fair play, tinha sido obra do genial Mané  Garrincha, em 27 de março de 1960, no clássico entre Fluminense e Botafogo. Nos  

registros  do  futebol  brasileiro  o  lance  no  Maracanã  é  até  hoje  apontado  como  o  primeiro  gesto  de  fair  play,  pois  Garrincha  teve  a  chance  de  marcar  um  gol,  mas  preferiu por a bola para fora para que Pinheiro (Fluminense) pudesse ser atendido  

depois de uma dividida com Quarentinha. O ato sublime de Garrincha, porém, não  foi  o  primeiro,  embora  tenha  sido  marcante,  pois  abdicou  de  um  gol,  tendo  em  seguida o tricolor Altair devolvido a posse de bola ao Botafogo. 

Não  menos  épico,  cinco  anos  antes,  no  dia  13  de  novembro  de  1955,  coube    ao    goleiro  argentino    Bonelli    a    iniciativa    de    jogar    a    bola    para    fora    de   campo para que o botafoguense Neco, que estava caído  na sua área, pudesse ser   atendido por um médico.  O lance, inusitado para aquela época, deixou os próprios  companheiros    do    goleiro  incrédulos,  sem    entender  aquela  situação,  enquanto  o  público  vaiava  a  atitude  curiosa  do  comercialino.  A  cena  foi  relatada  com  sur‐ 

presa nos jornais da época, surpreendendo também os jornalistas esportivos que  cobriam o clássico. A  partida  foi  válida  pela  última  rodada  do primeiro turno do  

Campeonato Paulista. O primeiro gol saiu aos sete minutos  com  Paulinho,  em  um   chute  que  desviou  em Assunção e enganou Bonelli.  Brotero estava endiabrado  

e fez dois gols,  aos 44 do primeiro tempo e aos dois da segunda etapa. Fernando  fez  4  a  0  aos  26,  e  quando  parecia  que  outra  goleada  como  os  5  a  0  de  maio  se   repetiria,  o  Comercial  reagiu  depois  que  Neco  foi  expulso  e  diminuiu  com  Acosta marcando dois gols de pênalti.  

 

(aqui por ser um jogo do interior, sem grande mídia, o fato passou despercebido, ao contrário do mega evento do Maracana e dos personagens envolvidos no clássico carioca. Mas o fato em si, já havia sido observado no jogo em Ribeirão Preto.  )

 

Botafogo 4 x 2 Comercial

(Campeonato Paulista ‐ Divisão de Acesso) 

Data ‐ 13 de novembro de 1955 (Domingo) 

Local ‐ Estádio Luiz Pereira

Botafogo ‐ Machado, Fonseca, Pavão, Nino, Oscar, 

Wilsinho,  Tico, Neco, Brotero, Paulinho e Fernando 

Técnico ‐ Floreal Garro

Comercial ‐ Bonelli, Toninho, Assunção, Diógenes e Lola; 

Sula, Acosta; Ademar, Mairiporã, Maneca e Paulo 

Técnico ‐ Arthur Nextor

Gols ‐ Paulinho 7 (1T), Brotero 45 (1T) e 2 (2T), 

Fernando 26 (2T) e  e Acosta 33 e 45 (2T) 

Renda e público ‐ Cr$ 233.860,00 (Não divulgado) 

Arbitragem ‐ José Bento Feijão

 

BHC deixa Comercial no túnel 

 

Para vencer um Come‐Fogo valia quase tudo, inclusive colocar hexacloro benzeno, conhecido também como BHC,  ou  "pó de broca", no vestiário visitante.  Essa prática comum  

em Palma Travassos, como no Santa Cruz, nesse dia 6 de abril  de  1975  não  ajudou  o  Botafogo  a  vencer  o  Comercial.  Só  fez  

com  que  o  técnico  Alfredo  Sampaio  realizasse  a  sua  preleção  nas  escadas  do  túnel  de  acesso  ao  gramado,  repetindo  no  in‐

tervalo do primeiro tempo. Os comercialinos apenas lamenta ram,  pois  sabiam  que  aquela  artimanha  também  já  tinha  sido  utilizada na Joia em outro dérbis. No estreito corredor, o preparador físico Roger  comandou  o  aquecimento,  pedindo  que  os  atletas  

tomassem cuidado com as paredes ásperas do túnel. Logo foi  interrompido por Alfredinho que passou as últimas instruções  

aos seus jogadores.

O  goleiro  Lourenço  foi  o  nome  do  clássico.  Com  grande  defesas  no  primeiro  tempo  e  segurando    uma  grande  pressão botafoguense na etapa final, o camias 1 do Comercial    saiu  de  campo  com  todos  os  prêmios  possíveis.    O  empate  manteve  por  mais  um  jogo  o  longo  tabu  sem  vitórias   do  Comercial  no  estádio  Santa  Cruz.  Marca  que  cairia na par‐ 

tida seguinte, ainda no ano de 1975. 

Carnaval do Magrão 

Pela  terceira  vez  consecutiva,  Sócrates  deixou  a  sua  marca  contra  o  Comercial.    O  primeiro  Come‐Fogo  de  1976  aconteceu  em  fevereiro  e  foi  válido  pelo  Torneio  Vicente  Feola.    A  vitória  dentro  do  Palma  Travassos  garantiu  ao  Botafogo  uma  vaga

e tirou o rival do páreo. Para  o  jovem  craque,  os  gols  no  Come‐Fogo  só  aumentavam  a  admiração  e  a  idolatria  que  os  torcedo‐

res botafoguenses tinham por ele.   O  clássico  foi  equilibrado  no  primeiro  tempo,  com  poucos  momentos  de  perigo  para  os  goleiros.

Na etapa final o Botafogo foi melhor. Mingo cruzou,  João  Marques  não  alcançou,  mas  atrás  dele  estava  Sócrates,  totalmente  livre  de  marcação,  para  bater  no  canto  esquerdo  de  Lula.  Eram  28  minutos  do  segundo  tempo  e  a  partir  daí  o  Comercial  não  teve  forças  para  buscar  o  empate  e  acabou  sucumbindo  mais  uma  vez  ao  talento  de  Sócrates.

 

 

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.