Walter. Wartão. Walter Pança. Walter Panzer. E viva o futebol
Walter dá um pique tão intenso quanto curto, arruma o calção com a mão esquerda, impedindo a camada adiposa de aparecer para as câmeras, e fuzila o goleiro com a direita. Para mim, saudosista do futebol lúdico e decepcionado com tantas modernidades, seria a glória um lance assim. O atacante do Goiás é meu ídolo nesse brasileiro. Alguém que comprova a tese que futebol é técnica, essencialmente.
É uma tese furada, concordo. Tudo mudou, o futebol é esporte de alta competitividade, é necessário deixar muito suor em campo. Já não há espaços para um lançamento "gersoniano", o grande craque seria cercado imediatamente por jovens bem dispostos e com gordura zero no corpo, pronto a desarmá-lo. Também, quem manda fumar? Gerson jogaria hoje em dia? Lógico que sim, Douglas, Ganso, Oscar, Jadson, Hernanes e outros jogam. Mas teria de se adaptar.
Sou sonhador, mas sou realista. Por isso, vibro tanto quando aparece um Walter a comprovar, uma vez mais, que futebol é o esporte mais democrático do mundo, congrega baixinhos, altões, dribladores, destruidores. Até gordinhos, de vez em quando. Valter só poderia jogar futebol, nenhum outro esporte. É possível imaginá-lo na seleção de basquete. Apesar de… Bem, deixa para lá. Os caras perderam para a Jamaica desfalcada de Usain Bolt e Bob Marley.
Posso contar, uma vez mais, a história que me seduz, que define o futebol. Menotti, campeão mundial pela Argentina em 78, disse uma vez que, em qualquer peneira de qualquer esporte, se um treinador recusar um anão, um aleijado e um gordão, terá 100% de certeza de haver feito a coisa certa. Mas, se for no futebol, ele estará correndo o risco de dispensar o anão Maradona, o aleijado Garrincha e o gordo Coutinho.
Agora, Vartão – me permitam chamá-lo assim, pois sou militante de um futebol com apelidos, com mais Neguebas e menos Gustavos Heblings – chega para dar um novo alento à tese de Menotti. É mais um a desafiar as impossibilidades.
Há dias, com o colega Gustavo Franceschini, entrevistei o Edu, executivo do Corinthians. E ele falou sobre um método diferente de contratações. O clube tem funcionários especializados em fazer "scouts" de jogadores. Quando aparece a necessidade de contratação, o laptop é acionado e mostra quantos desarmes, quantos dribles, quantas cabeçadas, quantos passes certos e errados foram dados pelo candidato à vaga em um determinado período. Futebol adotando métodos de beisebol.
Será que o Garrincha, que só driblava de um jeito, passaria? O Douglas, do próprio Corinthians, passaria? Não quero discutir o método, porque o Corinthians tem contratado muito bem, mas me dói ver o esporte que o povo ama reduzido a planilhas.
Wartão não passaria. Gols – ainda que belos como os que fez em Dida, do Grêmio – são apenas um item entre tantos outros que os "scouters" pesquisam. Não faz mal, deixa a ciência para lá, deixa a modernidade em outra plaga – a vontade é escrever praga – o que interessa é que Wartão joga muito. É meu ídolo atual. E, antes que pensem besteira, não há corporativismo nisso.
Se eu sou Dom Quixote futebolístico – é o que o corpinho permite – que se recusa a falar coisas como winger, playmaker, hat trick etc – Wartão é meu companheiro. Walter Pança. Walter Panzer. A exceção a mostrar que o mais belo de todos os esportes resiste às modernidades, aos scouts, à compactação, aos professores, e se consagra, uma vez mais, também como o mais democrático. Wartão neles.
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