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Menon

Racista, torcida do Betis mostra que a espécie humana falhou

Menon

25/11/2013 11h14

Sempre procuro escrever sobre assuntos atuais e sob um ângulo diferente. Nem sempre consigo, mas tento. E, em internet, o dia de ontem aconteceu há dez anos. A velocidade da notícia é cada vez maior. No domingo, escrevi sobre a vergonha do Fluminense, em cima da hora, mal havia acabado o jogo. E, meia hora depois, falei sobre a falta de respostas de Tite para explicar a falta de gols do campeão do mundo.

Passei batido pelo criminoso ato de racismo dos torcedores do Betis com o jogador brasileiro Paulão. Ele foi expulso e, ao deixar o campo, sofreu xingamentos racistas de sua própria torcida. As imagens mostram jovens brancos pulando e imitando macacos. Jovens brancos que, com certeza, tiveram vida melhor que Paulão, que eu nem conheço.

Preferi escrever sobre futebol. Não achei um ângulo diferente sobre essa escrotidão. Dizer que eu sou contra o racismo? Qual a novidade? É o mesmo que dizer que sou a favor da Paz Mundial, como fazem onze entre dez misses.

Mas a imagem não saiu da minha cabeça. Me fez mal. Me deu nojo e pertencer à mesma espécie humana daqueles jovens brancos. Melhor ser um macaco. Pensei em alguns intelectuais brasileiros que dizem não haver racismo simplesmente porque brancos e negros pertencem à mesma raça. Gostaria que explicassem isso à Paulao e aos seus algozes.

Me lembrei de uma piada triste sobre racismo. Tudo é triste quando se fala sobre racismo, inclusive saber que há intelectuais brasileiros que dizem não haver racismo. Mas a piada é a seguinte: um presidente dos EUA estava preocupado com a segregação racial, que chegava ao cúmulo de separar brancos e negros em ônibus. Ele foi a um ônibus e fez pequena conferência a todos passageiros. "Somos todos iguais. Vamos parar com essa história de racismo. A partir de agora, não somos nem brancos e nem negros. Somos todos verdes". Os passageiros, diante da oratória que não consegui reproduzir aqui, aceitaram ser verdes. E a aceitação ficou mais fácil quando o presidente disse. "Então, somos todos verdes. Agora quem é verde claro fica na frente e quem é verde escuro fica lá atrás."

E o tal ângulo diferente? Pode até ser diferente, mas é recorrente no que eu escrevo por aqui. Como seria a reação de muitos brasileiros se essa vergonha tivesse acontecido aqui? "Imagina na Copa", diriam. É o que dizem sempre, desde que o Brasil foi escolhido. A primeira vez que ouvi foi logo depois da escolha do Brasil para sediar a Copa. Estava em um jogo em Santo André em uma cabine de imprensa muito ruim. E um amigo soltou a pérola: Imagina na Copa, como se o Bruno José Daniel fosse ser palco de algum jogo.

Alguém falou "Imagina na Olimpíada" quando o brasileiro Jean Charles foi assassinado no Metrô de Londres? Alguém diria "Imagina na Copa" se a Copa fosse na Espanha, depois da atitude xenófova dos torcedores do Betis?

Não, para muitos de nós, a Europa é uma terra perfeita. Tudo lá funciona. Tudo lá é uma maravilha. E se esquecem de Berlusconi, se esquecem de Jean Marie Le Pen, se esquecem do cabo Adolfo…. Só nós é que não prestamos. E se esquecem por exemplo que foi Tuta, um brasileiro negro, que denunciou um esquema fraudulento de jogos na Itália.

Somos racistas também. Essa chaga pertence à humanidade, apesar de as demonstrações mais explícitas sempre apareceram na Europa. No Brasil, nem se trata de discutir quantos médicos negros há, quantos dentistas negros há. A pergunta é mais simples: quantas recepcionistas negras há em um consultório médico?

Mas estamos lutando contra nossas deficiências. A política de cotas raciais impede que, a longo prazo, viremos uma África do Sul, com seu apartheid pré Mandela. Aqui, as diferenças vão diminuir, graças a uma atitude do governo.

Estamos dando um exemplo. A espécie humana continuará sendo uma imperfeição, mas nossa pequeno grão de areia para melhorá-la foi dado. Paulão pode ganhar muito dinheiro na Espanha. Mas será um cidadão mais respeitado aqui, ao sul do Equador.

PS – Deveria trazer aqui o link com os atos raciais. Quanto mais gente vir, mais nítido ficará como falhamos como seres humanos. Mas, me deu canseira. Me deu nojo. É como se eu tivesse de carregar um penico cheio. Desisti

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.