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Menon

Globo erra em transformar Fred em herói nacional

Menon

16/04/2014 11h45

A música ao fundo contagia. As bandeiras brasileiras agitadas emocionam. O candidato – o narrador já deixou claro que ele tem fé e esperança – caminha em câmera lenta, com o braço direito levantado e o punho crispado. E o narrador coroa a peça publicitária, que encerra o horário eleitoral, com uma linda voz: "E Brasil tem um novo líder".

Poderia ser assim, mas não é. As bandeiras são do Fluminense, o candidato não é candidato, é Fred. Não existe peça publicitária e nem horário eleitoral. É apenas uma competente e controversa matéria do Esporte Espetacular. Mostra a justa luta de Fred contra as organizadas. E tenta transformá-lo em herói brasileiro, um exagero contraproducente.

A causa de Fred é justíssima. Eu transcrevi, aqui no blog, o seu manifesto contra as violentas gangues organizadas. Delinquentes que se chamam torcedores. Torcedores de si próprios, sanguessugas do clube.

A matéria mostra isso. Amplia as inseguranças de Fred, leva sua batalha aonde ela ainda não havia chegado. Mostra a tibieza bem educada do presidente do Flu, mais um desses falsos brilhantes que tomam conta do futebol brasileiro.

Mas, transformar Fred em líder do Brasil, em herói nacional ajuda na luta que deve ser de todos? "Triste é o país que precisa de heróis", disse o alemão Bertold Brecht.

Há 25 anos aproximadamente a Globo criou um herói nacional, um líder para o Brasil. Não era Fred. Era Fernando. Deu no que deu.

Não há comparação. Fred é honesto, corajoso, está abrindo uma ferida fétida, cheia de pus. Fred merece ser louvado. Mas se a luta da sociedade contra a violência das organizadas for baseada em um herói solitário, será uma luta inglória. Os delinquentes derrotarão Fred.

A violência das torcidas organizadas não surpreende em uma sociedade violenta e cheia de desigualdades como a nossa. O futebol é violento porque o país é violento.

As torcidas organizadas, porém, são muito mais frágeis que traficantes, sequestradores ou ladrões. Pode ser enfrentada. O nome dos violentos é conhecido. Há fichas de todos. São manjados, são identificados poucas horas depois de cada pancadaria.

Dá para prender. E isso, Fred não vai fazer. Não é sua tarefa

Quem tem de fazer é a polícia. E a Globo pode ajudar muito mais do que fazendo um belo clip com Fred.

Por que a Globo? Não por ser a emissora de maior audiência, mas por ser quem banca o futebol brasileiro. Os clubes vivem do dinheiro que a Globo paga pela transmissão dos campeonatos.

Então, que não adiante dinheiro para torcidas que financiam bandidos organizados. Não seria um primeiro ato importante para acabar com a violência? Se der dinheiro para bandido, não recebe adiantamento da Globo.

Faça uma campanha com o nome dos delinquentes fichados. Coloque uma equipe no encalço de cada um dos principais. Mostre à polícia que é possível ver onde estão, que é possível saber quem são. Duvido que prisões não aconteçam diante de tanto constrangimento.

E já que estamos sonhando porque não pedir à emissora que banca os clubes brasileiros que olhe com carinho as reivindicações do Bom Senso? Vejo muita coisa boa ali, coisas que poderiam, a partir de um calendário extenso, criar empregos para jogadores sem fama e fortalecer os clubes. A Globo poderia acabar com o futebol às 22 horas. Os estádios ficariam mais cheios.

Por fim, um pedido a Fred. Leve sua luta, que é corajosa e bonita, aos sindicatos e associações de jogadores. Procure o Bom Senso. Não fique só, não se isole. Não seja um herói solitário. Eles só derrotam o Mal nas histórias em quadrinho.

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.