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Menon

#112 Vitória, Kaká e a nefasta influência de empresários no futebol

Menon

06/07/2014 15h14

Vitória Miranda, amparada pela mãe, Carmem, e por um amigo, caminhou por vinte minutos até chegar ao Morumbi. Caminhou tropegamente. Com 18 anos, nasceu com uma perna mais curta que a outra e faz um tratamento de alongamento ósseo. "Já ganhei três centímetros mas ainda falta", diz, com alegria. O motivo da caminhada é a volta de Kaká. "Quando ele começou a jogar eu tinha cinco anos e já me apaixonei por ele. Virei são paulina por causa dele e hoje vim para comemorar vitoriaa volta dele para o meu time". E nem interessa se é por apenas seis meses. "Vou ver todos os jogos no Morumbi. Não vou perder nenhum".

Os homens de marketing podem imaginar quantas camisas, bonés e ingressos Vitória consumiu em 13 anos. É importante, mas não é só. Ela é apenas um exemplo de como o ídolo é importante para um clube. De como o futebol só sobrevive se houver ídolos. E, mais importante, é preciso lembrar que o amoro ao clube é sempre maior que o amor ao ídolo. A torcida que pediu por Lugano ontem, deixará de amar o uruguaio se ele for jogar em outro clube. Mesmo que o São Paulo não queira, como Carlos Miguel deixou claro, contar com ele agora.

Os empresários de jogadores deveriam tentar entender a relação de amor do torcedor com seu time. Nada me dá mais desânimo quando ouço um desses manés que estão ficando milionários às custas de jogadores dizem coisas como: "o ciclo de Jefferson Luan se encerrou nesse clube. Vou colocar ele em um outro" ou "Gian Washington vai dar seguimento à carreira dele em outro lugar porque precisa ser mais bem valorizado". "Ronaldo Marcelo Augusto fez de tudo para ficar, mas é necessário um upgrade". Pior ainda é quando jogadores mentem descaradamente quando falam assim: "estou focado apenas em jogar bola e quanto às negociações o meu empresário fala por mim".

Sou a favor da Lei Pelé. Acho que o sistema anterior é semelhante à escravidão.

Não acho que jogador deva viver sua vida apenas pelo coração. Não deve continuar em um clube apenas porque começou ali.

Não é isso. Mas o que se vê hoje é total falta de respeito ao clube. E o clube é o que simboliza o amor ao futebol. Jogadores como Thiago Neves, que assinou contrato com o Palmeiras e depois o rompeu, demorando um bom tempo para devolver as luvas recebidas. Gente como Amoroso que foi embora do São Paulo sem ao menos se despedir, sem ao menos dar a última entrevista fazem mal ao futebol com esse tipo de atitude.

O exemplo de Vitória – e há milhões de pessoas como ela – é que sustentam essa grande empresa chamada futebol

Bem, mas falemos de Kaká. Mostrou-se uma pessoa muito mais madura do que antes – bem, já se passaram onze anos – e deixou claro que tem ideias para o futebol brasileiro. Gostaria de uma organização no estilo da Bundesliga. Pode se integrar à turma do Bom Senso, que eu considero a chance de melhora de nosso futebol.

Kaká vai jogar por seis meses, antes de ir para os EUA. Falando cinicamente, vai fazer um bico por aqui. Não será assim. É uma pessoa de caráter e que percebe a importância que tem para o futebol a relação de amor do atleta com o torcedor. Kaká sabe que não é mais o jogador de 2007 mas disse que pode manter o nível técnico que tem mostrado no Milan. Se chegar perto disso, fará a alegria de gente como Vitória Miranda. Esse é o legado que o craque deixa. O legado que aos empresários abutres não interessa. Ganhar dinheiro é ótimo, mas deixar o futebol depois de passar por 345 clubes e não ser lembrado por nenhuma torcida é péssimo. Desse mal, Kaká não corre riscos.

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.