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River dá uma lição à arrogância brasileira, personificada em Carlos Miguel

Menon

11/12/2014 09h09

E foi como sempre é. Jogadores comemorando com a torcida. Um grito uníssono de dale campeón. Em seguida, músicas feitas na ruas, músicas de torcida ironizando o grande rival. Com direito a pedido de um minuto de silêncio pelo Boca, que lo mira por la teve. Um trio elétrico no campo e milhares de hinchas no Obelisco e nas praças de todo o país. Foi como sempre é. Uma festa popular, uma paixão compartilhada. Um grito de amor ao futebol.

Ah, como temos que aprender com os argentinos. Mas, paixão se ensina? E o que temos para trocar? Doses e doses de arrogância.

Passamos hoje por um período de elitização e emburrecimento de nosso futebol. Em muitos setores, da torcida ao dirigente, do jogador ao jornalista. Uma elitização que busca destruir o que se tem por aqui. Há um desprezo muito grande pela América do Sul, pelo seu jeito de festejar, por suas competições e até por seus jogadores. Enquanto isso, a Catalunha se rende ao brasileiro Neymar, ao uruguaio Suárez e ao argentino Messi.

Muitos brasileiros preferem ser Bate Borisov e Apoel na Liga dos Campeões do que vibrar e torcer com a Sulamericana.

Carlos Miguel Aidar é um exemplo. No ano passado, ao ser eliminado pela Ponte Preta, no Morumbi, disse que a Sulamericana é apenas um torneio caça níquel, que paga taxas ridículas. Pode até ser, mas quem é eliminado tão precocemente merece taxas maiores?

A arrogância continua. No programa A Bola da Vez da ESPN, o presidente do São Paulo disse que gostaria que existisse uma liga de clubes brasileiros que lutasse por verbas maiores e pelo direito de não disputar jogos a mais de 3 mil metros de altitude.

É a lógica do opressor. Do poderoso. Ao dizer que se recusa a jogar em La Paz ou Oruro ou Quito, o dirigente está delimitando o futebol. Está deixando claro que ele não é algo mundial, não é o que transforma o planeta em uma aldeia. Ora, porque gigantes como The  Strongest e Bolivar, objetos de amor, paixão e desejo de milhões de bolivianos não podem jogar em seu estádio? Qual a razão de afastar o torcedor do seu time?

A razão: jogadores brasileiros sofrem com a altitude e os bolivianos levam vantagem física no jogo. Sim, não há o que discutir. É um problema que cabe aos brasileiros resolverem, não aos bolivianos. Monte um elenco gigante e sem queda de categoria e mande uma parte ficar treinando 15 ou 20 dias em La Paz enquanto outra parte joga o Brasileiro. Lute por um calendário que permite mais tempo de aclimatação. Loucura? Sim, mas é menos loucura do que  querer arrancar os bolivianos de seu campo.

Tirado por Juvenal Juvêncio de seu retiro, Carlos Miguel Aidar assumiu o São Paulo sonhando em ser líder dos clubes brasileiros. Ironizou Itaquera. Isolou o São Paulo ao dizer aquelas bobagens higienistas sobre jogadores de bons dentes etc. Foi injustiçado no caso Allan Kardec, quando o único que fez foi praticar capitalismo. Enfim, viu frustrada sua tentativa de exercer uma liderança dos ricos contra os pobres. Contra o futebol.

Mas não é só ele o elitista. Vivemos no Brasil a era das arenas. Não é tão ruim como a era da Arena, mas também é preocupante. Hoje, os times entram juntos em campo, o presidente Zé das Medalhas limita o número de crianças acompanhando seus ídolos, Cruzeiro e Galo, além de rivalizarem no domínio do futebol brasileiro, brigam para ver quem esfola mais seus torcedores, cobrando ingressos a 700 ou mil reais.

Amigos corintianos reclamam que a torcida está diferente. Não vem negros no metrô no caminho para o Itaquerão em dias de jogos. O ingresso é muito caro e o Corinthians – fato raro – não teve a melhor média de público.

Na valorização das arenas, há o desprezo ao Morumbi, um estádio belíssimo, muito grande e que pode ser palco de grandes jogos. Pode ser tudo o que o Monumental de Nunez foi na vitória do River contra o Nacional. Lógico que há críticas aceitáveis ao estádio – estacionamento, dificuldade em chegar – mas é um palco histórico que não pode ser colocado como algo jurássico.

A coisa é tão ridícula que chegamos a ponto de discussões como: tiramos o Paul de vocês. Tudo bem, ficamos com o Foo Fighters. Quando algum jornalista se recusa a fazer propaganda grátis citando naming rights, é tratado como traidor da Pátria.

Que se reforme alguma coisa no Morumbi. É necessário. Mas que se saiba sempre que o importante é que a paixão pulse. Que o amor ao futebol exista e persista no Santiago Bernabeu, no Itaquerão, no Palestra, no Atahualpa, na rua Javari.

É a paixão, estúpidos.

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.