Juliana Cabral: "Falta respeito e organização no futebol feminino"
Juliana Cabral tinha 15 anos quando foi convocada, em 1996, pela primeira vez. Foi titular e capitã de 1999 a 2004, quando conquistou a medalha de prata na Olimpíada de Atenas. Afastou-se por três anos, voltou para disputar o Pan do Rio. Sofreu uma contusão que a tirou da Olimpíada de Pequim e antecipou o final da carreira. Jogou fora do Brasil, foi comentarista na televisão e rádio e hoje trabalha como professora no Colégio Pio 12.
Está acompanhando a participação do Brasil no Mundial do Canadá, com uma triste certeza: um bom resultado não significará maior respaldo e organização ao futebol feminino. Está esperançosa com a presença de Marco Aurélio Cunha como novo responsável pelo futebol feminino, mas não tem certeza de um futuro melhor. "Tenho um pé atrás com a CBF".
Leia trechos da entrevista.
Se o Brasil vencer o Mundial, o futebol feminino vai ser mais admirado e poderá se desenvolver no Brasil?
Admirado, ele já é. Atletas como a Marta e a Cristiane são conhecidas e admiradas. O que falta é respeito e organização. E não tenho certeza que vai mudar nada. Já ganhamos medalha de prata em Olimpíada e tem ex-jogadora vendendo caldo de cana na rua e trabalhando como motorista de ônibus.
Por que esta certeza?
Vou dar um exemplo: o governo repassou R$ 10 milhões para a CBF fazer um campeonato brasileiro. Fizeram um que durou dois meses e não teve repercussão alguma. Precisa ter uma seleção permanente, com apoio psicológico, com força física e mantendo a técnica. Tenho um pé atrás com a CBF, mesmo com a presença agora do Vadão e do Marco Aurélio Cunha.
Eles podem acrescentar alguma coisa?
O Vadão já está acrescentando. Acredito que um treinador de peso como ele não teria aceitado o cargo sem ter feito algumas exigências. E o Brasil já participou da Copa Algarve, em Portugal. Já foram 20 edições, reunindo as melhores seleções e o Brasil nunca esteve. Agora, já foi, acho que por um pedido do Vadão. Quanto ao Marco Aurélio, ele chegou agora. É uma pessoa que entende de futebol e que gosta de futebol. Vai fazer um bom trabalho.
Você gostaria de ajudar? Como treinadora, por exemplo?
Como treinadora, não. Nunca pensei nisso. Eu adoraria ver a Formiga como treinadora da seleção um dia. Ela é uma jogadora espetacular, tão boa como a Marta. Tem muito que dar para o futebol feminino. Eu poderia ajudar de alguma outra maneira, sou formada em Educação Física. Outras pessoas que a CBF deveria chamar são Romeu Castro e Rogério Aman, que sempre fizeram muito pelo futebol feminino.
O que você acha de clubes tradicionais entrarem no futebol feminino?
Tem um lado muito bom que é a divulgação e a presença da mídia. O ruim é que, como não tem trabalho de base, formam times com garotas que só pensam em aparecer. Fica um time de oba oba que tira o lugar de equipes mantidas como ajuda de prefeituras. Ali se faz um trabalho sério, mas não tem mídia. Então, elas não conseguem lugar no campeonato.
Você está desanimada com o futuro do futebol feminino?
Não é desânimo. Apenas já vivi muita coisa e sou desconfiada. Não procuro me enganar. Mas há uma coisa boa acontecendo. O Museu do Futebol está dando um espaço bom para o futebol feminino. Há até um debate mensal.
O que foi o futebol feminino na sua vida?
Foi o que moldou meu caráter. Perdi minha mãe com 13 anos e cheguei na seleção com 15. Me dediquei ao esporte e o esporte me formou como pessoa.
Ganhou dinheiro com o futebol feminino?
A resposta é simples: eu ainda moro no apartamento do meu pai.
Como zagueira, você batia muito?
Eu era zagueira como Gamarra e Mauro Galvão. Muito técnica, nada de bater. Saía jogando. A bola gosta de grama, eu sempre pensei assim. Agora, eu dava minhas cutucadinhas. Zagueiro que é zagueiro precisa, né?
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