Raí, Sócrates e a greve bizarra dos jogadores do São Paulo
Descontentes com atraso salarial – o que lhes dá razão em tudo, independentemente da quantidade de dias – os jogadores do São Paulo optaram por uma maneira totalmente insólita de protesto: recusaram-se a falar com jornalistas. Ou seja, abriram mão de contar, de forma direta, o que estava acontecendo nas relações trabalhistas do clube.
Deveriam, ao contrário do silêncio, chamar uma coletiva e dizer:
1) Nosso salário está atrasado tantos dias, mas continuaremos jogando em respeito à instituição e à torcida
OU
2) Nosso salário está atrasado tantos dias e não temos mais condições psicológicas de trabalhar. Este foi o último jogo.
OU
3) Nosso salário está atrasado tantos dias e a diretoria, mesmo sabendo disso, preferiu dar dinheiro para as torcidas organizadas no Carnaval.
OU
4) qualquer outra coisa. Não ter medo de expor sua luta, seu ponto de vista. Seria melhor, é lógico em uma situação menos vexatória do que uma derrota para o The Strongest, da Bolívia, em casa.
No programa Resenha, da ESPN, Raí disse algo sobre "mesquinhez" dos jogadores do São Paulo nessa questão. O atraso seria pequeno e a diretoria já teria se movimentado para solucionar o problema.
Pensei como seria a reação de Sócrates, irmão de Raí. Com certeza, estaria apoiando a greve. Ou, então, estaria à frente do movimento. No comando.
Raí, um grande jogador, e Sócrates, um gênio, tiveram posições diferentes sobre a vida. Raí, mais cerebral, mais contido, Sócrates mais mercurial. Raí planeja o passo a ser dado; Sócrates mergulhava no vazio.
E a grande contradição está aí: Sócrates, que era melhor tecnicamente, que encantava mais, me decepcionou mais porque dos gênios deve se cobrar mais.
Acho que ele poderia ter dado muito mais ao futebol do que a maravilha de seu futebol, do que o passe perfeito de calcanhar, do que o chute preciso após o chapéu, do que tudo o que deu.
Sócrates poderia ter sido um médico, um dirigente, um treinador, um empresário dedicado aos jogadores – e não os chupins que vicejam por aí – poderia ter sido – não teve tempo – um membro do Bom Senso, poderia ter sido tanta coisa….
Mente inquieta, não quis. Quando eu o entrevistei, pouco tempo antes da morte, disse que estava gostando de tênis e de jornalismo. Queria novos caminhos. Uma pena. O futebol perdeu muito com isso.
Raí fez o que podia. Sócrates fez menos o que podia.
Ambos, sem dúvida alguma, fizeram muito mais do que jogadores que optam pelo silêncio na hora de reivindicar o direito sagrado de todo trabalhador: receber o fruto de seu trabalho no dia correto.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.