Nada de novo na Europa. Bom para Tite
Terminou a Eurocopa e, se ela for entendida como uma feira quadrienal de novidades táticas, a decepção será enorme. O que se viu foi a vitória de craques indiscutíveis e heróis improváveis. Bom para quem gosta do lado humano do futebol se sobrepondo ao aspecto teórico. Neste quesito, do planejamento do que virá após o "vamos lá" da beira do túnel houve pouquíssimas mudanças. Como as embalagens de Maisena e Pó Royal, praticamente imutáveis por séculos. Tudo isso é bom para Tite, com campo livre para implantar seu estilo, sem se preocupar com novidades.
Portugal foi o campeão frugal. Venceu, vencendo muito pouco. Na conta do chá. Com onze jogadores contando mais uma vez a velha e emocionante história do "si, se puede", com uma linda cereja no bolo: o gol veio dos pés de Eder, órgão emigrado da Guiné Bissau. Herói improvável de um ataque improvável, ao lado do cabo-verdiano Nani e do cigano Quaresma. Quando Cristiano Ronaldo dedicou o título aos imigrantes, muita gente deve ter pensando neles. E nos moçambicanos Eusébio e Coluna.
Gales foi o exemplo do fulano e mais dez. Gareth Bale foi o comandante, mostrando que no maluco mundo das transações europeias, os 100 milhões de euros que o Real Madrid pagou por ele podem até ser considerados justos. Estratosféricos, mas justos. Foi uma campanha que transcendeu o esporte e caminhou pela afirmação nacional. A Inglaterra, que deixou a União Europeia por vontade própria, foi sacada da Eurocopa por seu companheiro de Reino Unido.
E, se de heróis improváveis falamos, a Islândia é um time de heróis improváveis. Na verdade, com 300 mil habitantes, a ilha dos vikings é um país improvável. Como montar uma seleção competitiva com 300 mil habitantes e com um território predominantemente tomado por gelo? Quanto à população, o Uruguai, com 3 milhões de habitantes já sofre, imagina a Islândia, que não tem uma tradição gigantesca a ajudar? Islândia, do grande escritor Arnaldur Indridason, agora é o país que levou 10% da população às ruas para saudar jogadores que o Mundo – até pela dificuldade sonora – esquecerá em pouco tempo.
Nada de tática. A Alemanha foi a Alemanha forte de sempre, surpreendentemente longe de sua fibra moral diante da França, comandada por um Pogba totalmente superavaliado. A diferença do que Pogba pensa jogar com o que ele pode jogar é pequena, mas a diferença do que Pogba pensa jogar e realmente joga é maior que o Rio Amazonas, é maior que o Gran Canion, supera qualquer catarata.
A Itália surpreendeu com um ordenamento tático que não abdicou de atacar. Mas não foi uma novidade enorme. Foi o suficiente, aliás, para vencer o último grande conceito futebolístico moderno implantado no futebol. Talvez seja cedo para decretar o fim do toque toque espanhol, da obsessão por ter a posse de bola, mas não foi cedo para decretar a demissão de Del Bosque.
Se lá, nada de novo houve, aqui, na Copa América, muito menos. As novidades sempre vem de lá. Aqui, prevaleceu o legado de Sampaoli, modificado por Pizzi. O Chile é o mesmo, mas não é o mesmo. Sem Valdivia, está menos técnico e mais combativo. Sem Mena, contundido, mostrou um Beausejour surpreendentemente efetivo no carril esquerdo.
Bem, quando a novidade é a Itália é porque não há novidades. Tudo mudou para não mudar. Como embalagens de Maisena ou Pó Royal. A tendência é o coletivo, para que o craque defina. Mesmo que o craque não seja craque. Seja Eder.
Tudo isso é a praia de Tite. Ele pode nadar de braçada. E, se Neymar não tem estofo moral para ser um comandante como Ronaldo, Messi ou Suárez, ele tem mais bola do que os heróis improváveis e belos e emocionantes que povoaram o mundo do futebol no último mês.
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