Topo

Menon

Renato merece uma análise isenta; não a Inquisição

Menon

13/12/2016 06h18

galileuRenato Portaluppi, o Gaúcho, comemorou seu segundo título em 16 anos de carreira, falando muita besteira. De óculos escuro, na sala de casa, negou a necessidade do estudo. Mais do que isso, colocou-se como alguém que não tem nada a aprender. E colocou companheiros como Tite e Mano Menezes na cota dos que nada sabem. Afinal, "futebol é fácil, quem sabe fica na praia e quem não sabe, vai estudar na Europa". Uma bobagem que poderia ser matizada se ele indicasse outro meio de evolução que não fosse a Europa. Nada disso. É praia.

O desabafo de Renato colocou gasolina na fogueira. O debate entre técnico estudioso x técnico boleiro cresceu. E Renato passou a ser rotulado como um bobão, como alguém que não entende de futebol, alguém capaz apenas de animar os jogadores. Nenhum mérito é dado a ele. Renato apenas seguiu o trabalho de Roger (da turma que estuda) e assim foi campeão.

É isso mesmo?

Procurei o amigo Diogo Olivier, jornalista gaúcho, comentarista no Zero Hora, na rádio Gaúcha e na RBS. Ele me traçou um esquema de como foi a transição de Roger para Renato.

1) Roger não conseguiu resolver um problema concreto: a substituição de Giuliano, meia pela direita no seu 4-2-3-1. Tentou Negueba. Não deu certo e o time começou a cair. O Grêmio perdeu muitos jogos e Roger pediu demissão.

2) Renato assumiu e tentou uma mudança tática, optando por um centroavante fixo. Escalou Henrique Almeida, que foi muito mal nos dois jogos em que teve chance. Renato recuou e passou a utilizar, como Roger, o centroavante móvel, o tal falso nove.

3) Renato optou por Ramiro, um volante detestado pela torcida, para substituir Giuliano. Ele fez um trabalho muito bom, no ataque e na recomposição. Deu força ao meio campo. Fez gol e deu passe para gol.

4) Renato recuou Douglas. O meia ficou mais próximo dos volantes e, a partir daí, com a bola dominada, passou a ter um rendimento muito maior. Armou o Grêmio e foi o grande nome da arrancada.

5) Renato mudou a marcação na defesa, que sofria muitos gols pelo alto. Optou pela marcação individual neste tipo de jogada e o Grêmio melhorou muitíssimo.

Ou seja, Renato fez um ótimo trabalho. Tinha uma base montada e fez com que ela melhorasse. É um grande treinador? Não acho. Vejamos o que fará em 2017, quando terá que buscar novas soluções diante de novos problemas. Problemas maiores do que Roger terá no Galo, onde, simplificando, basta arrumar a defesa.

E por que Renato não merece uma crítica isenta? Por que é bonito, feio, folgazão, tem filha feia? Não. Renato é criticado por não fazer parte dos cânones defendidos por aqueles que defender o futebol de estudo. Os scouts, os treinos intensos, tudo o que há de mais moderno e que tem sido utilizado pelos grandes treinadores.

Mas a beleza do futebol não é o fato de que se pode vencer de maneiras diferentes. Opa, para muita gente que defende com alma, sangue, unhas e dentes o futebol dos professores, vencer não é tudo. É preciso deixar um legado.

É uma posição extremada. Perigosa, por não permitir ideias diferentes. É assim ou assim. Se pensar diferente, é assado. Na fogueira da Inquisição, de onde escapou o físico e astrônomo Galileu Galilei, em 1633, aos 70 anos. Precisou negar o que defendia. As ideias de Nicolau Copérnico, que via a Terra girando em torno do Sol e não o contrário, como pensava a Santa Igreja Católica. Galileu recuou e ganhou o direito de continuar vivendo, mas sem sair de casa.

André Kfouri – sempre é um deleite lê-lo no Lance! – conta traz a análise de Rafa Cabeleira, jornalista espanhol, de El País. Ele diz que "se sabe que as vitórias e derrotas de Pep Guardiola só interessam aos inimigos de Pep Guardiola." E André explica que essas pessoas torcem intimamente por um fracasso que seja de Guardiola. E, quando ele vem, em forma de uma derrota, todos vão ao twitter comemorar. Mal comparando, vimos a mesma postura diante das ousadias de Osorio. Seus erros e derrotas causaram orgasmos múltiplos.

É o que se passa com Renato. Para ele, vale o que Carlos Lacerda dizia de Getúlio Vargas em 1950: ""O Sr. Getúlio Vargas, senador, não deve ser candidato à presidência. Candidato, não deve ser eleito. Eleito não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar."

Renato não pode ter emprego. Se tiver, não pode treinar. Se treinar, não pode vencer. Se vencer, não é mérito dele.

No frigir dos ovos, se você pensa diferente do que eu acho que é bom para o futebol brasileiro, você está errado. Deve ser combatido. Como os cristãos que fizeram as Cruzadas para impor a sua fé aos bárbaros árabes.

 

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.