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Menon

Juventus x Lusa, o clássico do amor

Menon

22/03/2017 15h45


Vinícius Pereira/Folhapress

Ah, se eu fosse o responsável para escolher um novo repórter…

Cordialmente, receberia o currículo.

Primeiro lugar na Eca, especialização em táticas defensivas, mestrado em táticas ofensivas, doutorado em transição, pós-doutorado em Globalização futebolística, fluente em inglês, italiano, sueco, francês e espanhol, professor assistente de mandarim na Universidade de Xangai, MBA em semiótica, segundo lugar no curso de catecismo em Caconde, terceiro colocado no campeonato de soletração de Casa Branca, participante da Banda Marcial de Aguaí, além de um link com 300 lindas matérias, todas de alto nível.

Eu olharia com cuidado o currículo, disfarçaria meu entusiasmo – sem contato visual – e, de repente, em um movimento brusco, olharia fixamente para o candidato e diria com voz ameaçadora:

Você já trocou de time alguma vez?

Se a resposta fosse sim, ou se fosse um não que me passasse desconfiança, eu agradeceria e procuraria outro candidato.

Sim, amigos, porque a verdadeira traição é a troca de time. Não é a mulher que troca o milionário pelo bombeiro, não é o diretor de cinema especializado em teste de sofá, não é o sacripanta que deixa a mãe no asilo para ficar em casa com a namorada nova. A verdadeira traição é a troca de time. A Redação perdoa um fã do Bolsonaro, mas não perdoa alguém que abandonou o São Caetano.

Por isso, o clássico do amor. Juventus x Lusa, as 15h na Rua Javari. Torcer por Juventus e Portuguesa é um ato de amor. Significa, no caso da Portuguesa, ir a campo sonhando com glórias passadas, com Djalma, Julinho, Ze Maria, Renato, Brandãozinho, Pinga, Simão. Significa, no caso do Juventus, trazer Brida e Brecha incrustados para sempre na ternura e na sinceridade do cantinho da saudade.

Torcer para Juventus e Lusa é criar canais próprios de informação. Nada de grande imprensa, nada de televisão, apenas e tão somente algumas rádios. A televisão passa o Sassuolo, passa o Beksitas, passa a terceira divisão da Islândia, mas não desloca uma equipe para mostrar um jogo desses. É encontrar parceiros de cornetagem virtuais, porque é difícil achar um igual, um parceiro de lamentação e de alegria. É como participar de uma seita.

É um ato de resistência. É gritar aos quatro cantos do Universo que o amor ao futebol não pressupõe títulos. Não é preciso ter uma sala cheia de troféus, não é preciso comprar um container para guardar taças, não é preciso gritar é campeão. Basta xingar o juiz de ladrão, basta chamar o lateral de mardito, o goleiro de morfético ee o ponta de lazarento. Sim, porque no futebol de que tratamos aqui, não só as ofensas são old fashion. Aqui, ainda existe ponta e beque. Se bobear, tem harfe. Nada de winger, double six ou box to box.

Para torcedores assim, só resta o campo, mesmo que lutem para não cair. Se não for o futebol, o que lhes resta? Gritar que seu programa de sócio-torcedor é mais completo, dá direito até a foto com o Pateta na Disney, berrar que o CT é número um, que seu diretor de futebol é mais ágil e que o CEO sabe a abertura Nimzovitch no xadrez? É futebol, só. No caso de hoje, podem entrar também em um concurso de camisa mais bonita. Sérios rivais para a verde e preta do América Mineiro.

São duas torcidas diferentes. A Portuguesa com sua turma móvel, sempre atrás do goleiro rival, uma torcida com pensamento em Dom Sebastião, esperando um Redentor…A do Juventus, mais moderna, imitando cânticos argentinos…Até acho um pouco modinha. Tenho lembranças da Ju Jovem.

O futebol é paixão, mas também é lúdico. Pegar o metrô, descer a rua dos Trilhos, caminhar até a Esfiha (sim, com letra maiúscula) ver os amigos de paixão, sentir-se incluído, sentar a bunda no cimento, com um bom espaço, comer alguma comida horrível e amar. O seu clube de coração. E o futebol.

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.