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Rogério Ceni precisa sair da bolha que criou

Menon

13/05/2017 10h18

O garoto da bolhaA entrevista de Rogério Ceni, após a terceira eliminação em 22 dias, foi muito pior e mais preocupante que a própria derrota. Ela deixou claro que o revés não terá o efeito mola, não será ponto para inflexão. Sabe aquela história de usar o limão para fazer uma limonada? Pois é, passou longe. Ao ouvir a entrevista, fiquei em dúvida: Rogério acha mesmo que está tudo bem? Ou ele sabe que não está bem e acha que irá convencer os outros? Nós, pobres mortais?

Eu me lembrei de dois casos em que minha carreira cruzou com a de Ceni. E eu como coadjuvante, deixo claro. Não sou do tipo que me coloco no mesmo nível do astro, da estrela. Já tive chefe que se colocava no mesmo nível de Zagallo, por exemplo. Não é uma questão de criticar Zagallo, o que é totalmente aceitável. Não. É uma questão de se achar tão importante para o futebol brasileiro como Zagallo é. Vou citar os casos apenas para mostrar que Ceni não evoluiu em um aspecto muito importante: a autocrítica.

Caso Um – Em 10 de abril de 1997, cobri Portuguesa x São Paulo no Canindé. Era o início do primeiro ano de Ceni como titular, sem a sombra de Zetti. A Lusa venceu por 1 a 0, gol de Moreno, de cabeça, na metade do segundo tempo. Naquele tempo, repórter entrava no vestiário para entrevistar jogador. Perguntei a ele se havia falhado. Ele respondeu assim: "se fosse o Zetti, você não perguntaria isso, não acharia que ele falhou".

Caso Dois – Alguns anos depois, Rogério já era o protótipo do grande ídolo que seria. Após um jogo internacional, ele citou o número de gols que havia marcado. E, na sua conta, entravam gols que havia feito em decisões por pênalti. Argumentei que ninguém fazia isso. Ele disse que achava justo, porque realmente havia feito os gols. "Fiz, não fiz", perguntou. Então, respondi que, se ele considerava gols que fazia em decisões por pênalti deveria considerar também os gols que sofria em decisões por pênalti. Para que as estatísticas fossem justas. "Como você acha que eu devo fazer as comparações", perguntei. "Faça o que você quiser, não me interessa".

É uma dificuldade muito grande em sair do mundo que criou para si mesmo. E a entrevista mostrou que não mudou nada. Quando torturado, os números gritam, é uma expressão de economistas. E ele vai dizer que o aproveitamento no Paulista deixaria o São Paulo entre os três do Brasileiro. Ora, são adversários diferentes. É muito mais difícil vencer no Brasileiro do que no Paulista ou Gaucho ou Carioca ou Paraense…

Dr Ulysses Guimarães, um liberal que faz muita falta neste país insano em que parte da população mais instruída já embarcou no canto da sereia bolsonara, para enfrentar os números tortos da Ditadura dizia que "se você colocar um homem com o corpo no forno e a cabeça na geladeira, teria uma temperatura média normal, mas teria morrido ou queimado ou congelado".

Para que ironizar o repórter Humberto Ferreti, dizendo que, mesmo com treino aberto, muitos jornalistas não entenderiam nada de seus treinos? Ora, mas é tão diferente assim, tão genial assim, tão revolucionário assim? Será que o jogador entende? Ou só jornalista é burro? Garanto que 90% dos repórteres sabia que Neílton não daria certo. Desde a sua contratação. Ceni acha que vai dar. E, depois de 17 dias de treinos, escala Neílton. E o saca, 45 minutos depois.

E Sidão? Como um goleiro extraordinário como Ceni foi, pode apostar em Sidão? E Cícero, é mesmo volante? Estava certo dispensar Reinaldo, Mateus Reis e Carlinhos para contratar Edimar?

E muitos outros erros. E muitos acertos. Muitos. Mas é necessário que Ceni saia de sua bolha, veja o mundo, perceba que ele não está sempre certo. Só tem a crescer com isso. Difícil mudar, se repete em 2017 o mesmo discurso que era moda em 1997

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.