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Menon

Jornalismo, vôlei e eu

Menon

21/09/2017 06h23

Amigos, queria convidá-los a uma reflexão.

Há uns meses escrevi um post chamado "Eu não gosto de vôlei". Minha amada acha que eu exagerei. Amigos que eu admiro tanto conversaram comigo e disseram que eu exagerei. Um deles argumentou tecnicamente. Passado um tempo, mensurando as opiniões, também acho que exagerei. Mas não é de arrependimento que vou falar. É de jornalismo.

No dia seguinte, li uma contestação muito bem fundamentada sobre o meu post. Era do professor Cacá Bizzochi. Imediatamente a publiquei no blog. Dei a ela todo espaço que havia dado ao meu post. Os atletas Felipe, o capitão Giba e Carol Gattaz compartilharam em suas redes sociais o meu texto, juntamente com contestações e críticas educadas

Criou-se, então, uma bola de neve. Outras pessoas, apaixonadas pelo vôlei, passaram a me criticar. Meu instagram recebeu 280 mensagens. Depois, parei de contar. Meu facebook também.

As críticas variavam de ironia a ameaça de morte.

Você não gosta de vôlei porque não sabe nem sacar por baixo (a segunda parte da sentença é verdadeira).

Você é gordo.

Você é gordo mórbido.

Você é infeliz.

Se você não ama o seu país, cai fora. (Passei minha adolescência nos anos de chumbo e havia um adesivo que dizia: "Brasil, ame-o ou deixe-o". Baseado em política e no princípio do pensamento único. Afinal, era Ditadura. Agora, a frase foi modificada por causa de um esporte. Quem não gosta de um esporte, não gosta do país. E deve cair fora.

Se você trabalha com esporte, não pode criticar. Se não tiver vôlei, vai viver do que? (Essa é clássica, só muda o nome do esporte).

Você defeca pelos dedos.

Você defeca pela boca.

Você não tem o direito de vibrar com as medalhas do vôlei.

Sorte sua que eu não sei o seu endereço, porque senão eu iria te matar. Com uma facada.

Não estou dizendo isso para pagar de coitadinho. Quem escreve o que quer, lê o que não quer. Tenho casca grossa e seguro a barra.

Sou um alvo fácil. Literária e literalmente falando. Ainda bem que não escrevi "Eu não gosto de MMA".

E a reflexão que faço é a seguinte. Quem fez mais mal  para o vôlei, eu ou os dirigentes que cuidaram tão mal das finanças da CBV?

Quem prejudica a imagem do esporte brasileiro, eu ou o presidente do COB, indo prestar depoimento sob acusação de compra de votos para transformar o Brasil em sede da Olimpíada?

Quem deslustra o vôlei, eu ou a torcida que ofendia o jogador que assumiu ser homossexual? A cada saque, uma ofensa. Uma gritaria insana, um linchamento público e moral?

Como os atletas do vôlei se posicionaram sobre esses temas? Foram solidários ao colega, questionaram os dirigentes? Salvo engano, eu me lembro do jogador Murilo criticando os absurdos que ocorreram na CBV.

O governo brasileiro anunciou que diminuirá os gastos com bolsa atleta, um dos pilares do desenvolvimento do esporte olímpico no Brasil? Algum atleta brasileiro falou alguma coisa? Algum fã de vôlei ou basquete ou bocha falou algo? Alguma comissão de atleta faltou alguma coisa? Na verdade, algumas pessoas falaram, sim, mas não é nada organizado, não é um protesto. Soa mais como um lamento.

Enquanto preferirem atirar no pianista, o esporte olímpico do Brasil continuará abaixo de suas possibilidades.

Meu post também levou a posicionamento de jornalistas. Nota, eu acho corporativismo um saco. Só serve para abortar discussão de ideias e discussão de ideias pode trazer a luz.

Mas, quando o capitão Giba publicou um post no instagram questionando o que eu escrevi, uma colega com quem eu havia me solidarizado quando ela sofreu um bullying por parte de uma torcida de um grande time, publicou lá um coração ou algo assim. E disse meu ídolo, meu herói, algo do tipo.

Um jornalista pode ter heróis, pode ter ídolo? Eu tenho, mas em outro setor, não no esporte. Não conseguiria ser imparcial escrevendo sobre política, por exemplo.

Um outro colega, professor, qual Zeus, desceu do Olimpo e me atingiu com um raio. "Isso é que dá quem é especializado em futebol começar a escrever sobre outro esporte. Será tema de minhas aulas".

Que entendimento tem esse professor? Jornalista é algo estanque? Jornalismo barra esporte barra futebol é diferente de jornalismo barra esporte barra vôlei.

O seu texto no facebook logo foi apoiado por outra colega, que comprou a tese. Logo ela, que nunca trabalhou com esporte, dizia o que cada um deve fazer.

Respondi a eles seguindo o raciocínio deles, de entendimento do jornalismo esportivo como algo fragmentado. Disse que já fui editor de "esportes amadores" e que já cobri duas Olimpíadas, um Pan, um Mundial de Basquete e um de Handebol.

A resposta foi "vamos tomar um café para conversar sobre isso".

Vejam bem: o professor afirma que eu sou incapaz de escrever sobre um assunto, eu o questiono e ele, magnanimamente me convida para tomar um café tendo por fundo a discussão sobre minha capacidade ou não de escrever sobre vôlei. Eu poderia me defender da acusação de incapacidade que ele publicou em uma página de rede social.

Nem respondi.

A colega Carolina Canossa, que não conheço, foi perfeita ao ser questionada por seus leitores. "Não concordo com nada do que ele falou, mas ele tem o direito de falar o que quiser em seu espaço". Muito obrigado.

Por fim, quero dar um exemplo "triangular".

A critica B

B se recusa a dar entrevista para C.

Quem atrapalhou o trabalho de B? Foi A ou foi C?

Uma dica para a resposta:

Jornalista deve prezar sempre a liberdade de imprensa.

Jornalista deve lutar sempre pela liberdade de imprensa.

Jornalista deve praticar sempre a liberdade de imprensa.

No caso, me parece claro que não foi A quem afrontou esses princípios.

A, no caso eu, tem casca grossa e segura as suas barras, ao lado de seus amores e de seus amigos.

E vai continuar fazendo jornalismo que é a profissão que ama e que respeita.

Um abraço a todos.

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.