Topo

Menon

Ex Corinthians e Flamengo, André Brazolin é o Anjo do Esporte

Menon

17/12/2017 04h00

Treinamento feito por Brazolin na Cracolândia

Confira abaixo como é  exaustiva a agenda de trabalho de um anjo em tempos natalinos:

Dia 14 – Visita a crianças carentes em Araçariguama (São Paulo)

Dia 15 – Visita a asilo

Dia 16 – (manhã) – Aula de basquete para crianças da Cracolândia

Dia 16 (tarde) – Visita à favela de Paraisópolis

Dia 17 – Visita à comunidade Vila São Pedro (São Bernardo do Campo)

Dia 18 – Treino de basquete em Heliópolis e na Fundação Casa, em Guarulhos

Dia 19 (manhã) – Palestra para jovens em São Mateus

Dia 19 – (tarde) – Palestra em Paraisópolis

Dia 20 – Palestra em clínica de recuperação em São Bernardo

Dia 21 – Visita a presídio no interior de São Paulo

Dia 22 –Visita em casa de passagem de imigrantes refugiados

Dia 23 – Viagem para passar Natal na casa do irmão.

Dia 26 – Começa tudo novamente.

 

O "Anjo" tem olhos azuis e já teve cabelos loiros, apesar de ser descendente também de negros. O nome é André Brazolin, 47 anos, ex-armador de basquete, com carreira consolidada em clubes como Flamengo, Corinthians, Franca e nas seleções de base do Brasil.

Teve sucesso na carreira. Os pais são donos de uma empresa de mármore. Dinheiro, nunca faltou, mas nada disso importa. "Eu  gosto de alma, gosto de mudar pessoas, gosto de fazer o bem. Só assim, sou feliz".

Para colocar em prática seu modo de ser feliz, André criou o Instituto Brazolin – Anjos do Esporte, que atua em duas frentes: gerenciamento esportivo e reinserção social. Ele conta com ajuda da companheira Talita, no gerenciamento e no voluntariado.

São vertentes que não se misturam: como gestor, fez um convênio com a Prefeitura de São Bernardo do Campo (SP) para as equipes de handebol e basquete, masculino e feminino. Ganhou os quatro títulos nos Jogos Abertos.

E através de dinheiro vindo de palestras para empresas, faz…o bem.

Tudo começou há muito tempo, quando André tinha dez anos. "Morava em uma casa bonita, com piscina e quadra, na Cidade Jardim, vizinho à Favela Jânio Quadros, que nem existe mais. Eu passava na rua e via crianças pobres, fumando, roubando e ameaçando com canivete. Pedi ajuda para meus pais e levei todo mundo para minha casa para jogar basquete e nadar. Ajudei e eles mudaram de vida. Então, não parei mais, nunca mais".

Foi assim que nasceu o Favela Esporte Clube, que disputou campeonatos de basquete e de futebol.

Ao mesmo tempo, André foi jogar basquete no Pinheiros. Era o melhor da categoria, o armador que fazia diferença e que iria para a seleção brasileira. Ficou por lá três anos, ganhando tudo, quando surpreendeu a todos.

Procurou José Cláudio dos Reis, dirigente do Continental, o clube mais pobre da Liga.

Quero jogar para vocês.

Imagina, você é o melhor de todos, nem temos dinheiro para pagar alguma coisa.

E quem falou que eu quero ganhar?

André foi para o Continental, que passou de 14º para quarto e depois passou a ganhar títulos na categoria.

"Eu era o olho de Tigre, um bom armador. Não fazia muito ponto, porque, na hora da bandeja, eu parava para dar a bola para alguém do  meu time que ainda não tinha pontuado. Queria ver todo mundo feliz".

Presente em todas as categorias de base da seleção brasileira, Brazolin teve também passagem por uma seleção de novos. A principal, nunca foi alcançada.

Brazolin visita asilo

"Eu nunca fui um atleta. Tinha muita facilidade para engordar. Quando chegava as férias, tinha de passar 15 dias em um spa para perder peso. E também eu não tinha vontade de fazer cestas.

Ele se profissionalizou no Monte Líbano e teve uma carreira sólida. O maior momento foi ser campeão pelo Flamengo.

"Eu tinha dez anos e ganhei um autógrafo do Oscar Schmidt, meu ídolo. Quando ele foi para o Flamengo, eu também quis ir, já estava com 31 anos, em 2002. Não tinha mais verba e joguei em troca de casa e comida. Quando ganhamos, o Oscar me agradeceu, abraçou e beijou. Se eu morresse naquele dia, seria feliz.

O basquete acabou, André se mudou para São Lourenço (MG) para administrar um hotel.

"Com 15 dias na cidade, o prefeito me chamou para ser secretário de esportes. Depois, fiz o mesmo trabalho em Caxambu. Mas percebi que dependia da eleição do prefeito, então resolvi criar o Instituto para ficar livre. Hoje, tenho orgulho de ter parceria até com a Cruz Vermelha".

Através da Cruz Vermelha, chegou aos refugiados, agregando uma vertente a mais no seu menu de ações, que se constitui de ressocialização de presos, de palestras em asilos e de inserção social de jovens carentes em favelas e na cracolândia. Em 2017, o time adulto do Instituto Brazolin Paraisópolis foi vice-campeão em uma liga amadora.

Em 2018, ele terá convênio com quatro unidades da Fundação Casa. E continuará seu trabalho, que pouco nenhum dinheiro dá. E que nenhum dinheiro paga.

Anjos do Esporte de Paraisópolis

E vale a pena?

"Sou corintiano e joguei no Corinthians. Sou fã do Oscar e fui campeão com ele. Deus me deu tudo isso e eu preciso retribuir, levando a palavra dele e a bondade para os outros. Se eu estiver em um local com dinheiro e aparecer alguma criança perto, eu vou a falência. Não cuido dos negócios da família por isso, já vendi meu apartamento. O dinheiro não é meu parâmetro de jeito nenhum. Eu joguei em Suzano, foi o tempo em que recebi mais e também o tempo em que fui mais triste."

Se o dinheiro não importa, não é parâmetro, há que se buscar a certeza de estar fazendo tudo certo em outros termos de comparação.

A recompensa vem, por exemplo,  com o traficante preso que lhe implorou para que ensinasse basquete para o filho livre, para que também não terminasse na cadeira.

Vem com o assassino que batizou o filho como André Brazolin e garantiu que, se o tivesse conhecido antes, não estaria preso.

A recompensa vem com Riquelme, que treinava no Instituto Brazolin na favela de Paraisópolis e agora está federado e atuando em São Bernardo do Campo.

E com o garoto que roubou a casa de André, em Minas e que ele trouxe para trabalhar na casa de sua mãe, em Cotia.

O Anjo é ambicioso, se é que isso é possível. E tem uma meta de vida para ser conquistada em breve. Está se esforçando muito para que de certo.

"Meu sonho é entrar em Pedrinhas, o presídio mais violento do mundo. O pior de todos. Fica no Maranhão. Esse presídio é um Inferno".

E o que é o Inferno para quem é Anjo?

Parceria com a Cruz Vermelha

 

 

 

 

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.