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Jair, Dorival, Ceni e a tortura dos números

Menon

05/03/2018 11h52

As coletivas pós-jogo tem se tornado um exercício de autolouvação dos treinadores. (Obrigado, Zé Ricardo, que trocou São Paulo pelo Rio). E além disso, um exemplo prático de como os números, assim como os seres humanos, quando torturados, dizem tudo o que o torturador quer dizer. Quem nos dava um exemplo disso era dr. Ulysses Guimarães, comandante civil da luta contra a Ditadura. Quando diziam que a média salarial do brasileiro era boa, ele dizia. "Se você puser a cabeça de um homem no freezer e os seus pés em uma fogueira, a temperatura média estará boa. E ele estará morto. Congelado ou queimado, mas morto".

Jair Ventura, após o empate contra o Corinthians comemorou o fato de o Santos haver conseguido a maior posse de bola no jogo e também na partida anterior, contra o Real Garcilaso.

Posse de bola. O fetiche dos treinadores, o Santo Graal dos críticos.

Mas, qual posse de bola? A do Manchester City, que encurralou o Chelsea, que não o deixou respirar, que o obrigou a chutões para se livrar da bola e que venceu por 1 x 0 em uma grande injustiça?

Não, a posse de bola de Jair é outra.

Teve 56% contra o Real Garcilaso e finalizou cinco vezes, apenas uma no gol. E sofreu 23 finalizações, 14 delas no alvo.

Teve 53% contra o Corinthians e finalizou mais, 15 contra 12, mas empatando em seis, quando se fala em chutes no alvo. E teve, não, não está errado, 47 cruzamentos. Um a cada um minuto e 45 segundos.

A maior posse de bola do Santos não impediu que o time ganhasse UM ponto em seis. Contra o Garcilaso, ficou 79 minutos atrás. Contra o Corinthians, 66 minutos atrás.

Qual a vantagem de se ter posse de bola e render tão pouco?

Jair me lembrou Rogério Ceni, que chegava nas entrevistas e, para justificar uma derrota, debulhava números e números. Um dia, falou no número de cruzamentos, quesito que não deveria orgulhar ninguém.

Quando a entrevista pós-jogo não é autolouvatória, ela pode se transformar em um muro de lamentações. Ceni reclamava que não tinha tempo para treinar. Aí, teve 17 dias livres. Foi eliminado pelo Defensa y Justicia e disse que o time havia perdido o ritmo de jogo.

Se Jair usa números, Dorival Jr. usa dados subjetivos.

"Vocês acham que o São Paulo merecia perder os clássicos contra o Corinthians e o Santos"?

Ora, a questão é outra. Se não merece perder, por que perde? Problema psicológico? Ele precisa resolver o assunto e não ficar dizendo que não merecia. No Paulista do ano passado, o São Paulo venceu o Santos na Vila, por 3 x 1. Todo mundo achou que o São Paulo mereceu. Menos Dorival. Ele era técnico do Santos e usou a lamentação, como agora. O mesmo argumento-lamento.

Dorival usa a evolução como mantra. Uma evolução do tipo da anistia defendida pelo General Geisel: "lenta, gradual e segura". O São Paulo precisa de ruptura e ele fala em evolução. E que resulta em aproveitamento de 46,7% em dez jogos. Até os Arautos da Ordem Sagrada do Tempo aos Treinadores, já acha que dez jogos é um bom número para se esperar algo mais do que se tem. Dos 16 times do Paulista, apenas seis ganharam menos pontos.

Mas, a cada jogo, volta a questão da evolução. Dorival vai acabar excomungado pelo Bispo Crivella, aquele que odeia Darwin, Carnaval, Futebol e Brasil.

Enfim, está cada vez mais chato ouvir coletiva pós jogo. Mas, se o futebol que se joga aqui é ruim, sem inventividade, um eterno rame rame escorado em estatíticas, por que elas seriam boas? São os mesmos professores, escalando, trocando e falando.

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.