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Menon

Proponho o fim da arbitragem no Brasil

Menon

30/04/2018 09h00

Amigos,

Eu joguei muita bola, lá em Aguaí. Em quantidade e não em qualidade. Só jogava porque era o dono da bola, mas joguei. E saúdo aqui os amigos da pelada lá da rua Washigton Luiz com General Osório e que viraram celebridades na cidade: Zeca do Anísio, Mirto do Anísio, Nonô, que depois virou Ratão, Wilson Perina, Zé Leite, Merinho, Anselminho, Paulo Grilo e Valdirzinho, o nosso Garrincha Loiro. Tinha também o Edinho, filho do Dito Corimbatá e irmão da Cleonice (ah, Cleonice…), mas esse era ruim como eu.

Jogamos juntos por anos. Dos cinco aos doze, pelo menos. E nunca houve briga. O jogo não tinha juiz e seguia quatro regras básicas.

Pediu, parou – A mais importante de todas. Se alguém achava que havia sofrido falta, gritava na hora. Falta. E todo mundo aceitava. Podia reclamar, falar que o outro era menina, era viadinho, mas parava. Era a pedra basilar da nossa construção ludopédica. Se tivesse muita discussão, muita briga, o jogo rendia menos e logo chegava a hora de as mães chamarem para fazer lição de casa. Tinha de aproveitar o tempo disponível.

Dois num é falta – Quem tinha a bola, só podia ser combatido por um adversário, nunca por dois ou três. Era falta. Proteção total ao futebol-arte. Pensa que é fácil marcar no mano a mano o nosso Garrincha?

Prensada é da defesa – Uma compensação ao dois num. Se o atacante tinha o privilégio de ser marcado apenas por um, ele que resolvesse o problema. Uma prensada era arma defensiva muito bem aplicada.

Fairplay – Não tinha esse nome, é lógico. Mas existia na prática. Quando uma mulher (apenas mulher) passava pelo nosso Maracanã, aquele pedaço de rua de terra, sem calçadas, o jogo era brecado imediatamente. E todos ficávamos parados, como estátuas. Quem tinha a bola, tinha também a certeza que nenhum rival iria se aproveitar para diminuir o espaço. O jogo só continuava quando já não havia gente passando.

É um conjunto de regras simples e que trazem em seu bojo muita dignidade e nobreza. Impedia a malandragem, incentivava o drible e além disso dava uma muleta ao defensor.

Se fossem implantadas no futebol brasileiro, tudo melhoraria.

Primeiro, porque nossos árbitros são péssimos. Prepotentes, estão em campo não para levar o jogo até o final, mas sim para mostrar que quem manda aqui sou eu. Muitos são PMs e trazem para o campo o conceito de hierarquia e de obediência cega. E tome cartão se olhar feio para mim.

Com árbitros ruins, há uma profusão de erros. E o fim de noite para quem gosta de futebol transforma-se em martírio. Os programas de televisão em vez de explicarem porque o time perdeu, empatou ou ganhou, ficam garimpando lances polêmicos. E a atração da noite é a figura do comentarista de arbitragem.

Podia ser um bloco de 20 minutos. Mostra o que acha certo e errado e pronto. Dez jogos, dois minutos por jogo. Finito. Mas, não. É preciso garimpar lances polêmicos. Mesmo que não sejam.

Para mim, não foi pênalti, diz o analisa de arbitragem.

Para mim também não, diz o comentarista um.

Concordo, diz o comentarista dois.

Nada, afirma o terceiro.

E cadê a polêmica, se todos concordam?

Hoje, no pós jogo, se discute mais a amplitude da mão do zagueiro quando a bola bateu nela do que a amplitude do time em campo.

Tal lance não foi pênalti porque o zagueiro cutucou o atacante com uma força de 1,8 toneladas por centímetro quadrado e a Fifa recomenda que pênalti só seja marcado com força superior a 1,9 toneladas por centímetro quadrado.

E a discussão não acaba porque os tribunais, esse poço de vaidade, não trabalham com rapidez. O jogador foi expulso no domingo, então tem efeito suspensivo, tem recurso e no final, o julgamento sai dez dias depois.

Uma chatice. A judicialização do futebol.

Bem, lembram que lá em cima eu falei que as regrinhas básicas de nossa pelada tinham em sua essência um código de honra? Por isso mesmo, não daria certo implantá-las no Brasil. Aqui, os jogadores são pessoas sem caráter esportivo. Como o poeta descrito por Fernando Pessoa, "finge tão completamente que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente." Um encontrão vira um show barato. O sujeito cai e rola no chão, como um golden retriever ensinado. Pulam, colocam a mão na cara, choram. O cara chuta 17 ossos do adversário e aponta para a bola. Outro sofre com o sol na cara, cai e pede cartão para quem estiver mais perto.

Uma tristeza só.

O futebol brasileiro se afunda na mediocridade dos árbitros, na vaidade de membros de tribunais e na falta de caráter esportivo de jogadores.

Mas é o que tem para hoje.

E a gente não perde um jogo.

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.