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Zagallo, Telê e Saldanha

Menon

12/04/2019 20h57

O texto abaixo é de 9/8/2011

O alagoano Mário Jorge Lobo Zagallo completa 80 anos hoje e, apesar de bicampeão mundial como jogador, campeão mundial como treinador e campeão mundial como membro da comissão técnica, ainda é contestado. Quando vejo isso, passo a duvidar de certos traços característicos da personalidade brasileira, tão exaltados. Não somo conciliadores, ao contrário gostamos é do preto no branco. Para que um seja bom, é preciso que outro seja destruído. Duas pessoas não podem ter mérito ao mesmo tempo. Há uma necessidade imensa de destruir. De levar toda discussão como se estivéssemos falando de lucifer x gabriel.
É lógico que Zagallo contribui para que esse clima se instale. Tão criticado, ele reagiu contra aquele a quem passou a considerar como inimigo futebolístico: Telê. Mas é fácil entender o raciocínio de Zagallo: "eu ganhei uma Copa e ele perdeu duas e porque só falam bem dele"? Então, passou a reagir e a contestar. Nunca chegou ao nível de grosseria de Dunga, que passou a considerar os jogadores de 82 e 86, além de Telê, como inimigos a serem destruídos. Pelo menos, o legado deixado por eles.
As críticas futebolísticas a Zagallo, em relação a 70, são ideológicas e refletem um certo banzo, uma saudade eterna do "verdadeiro futebol brasileiro", coisa que pouca gente define realmente o que seja.
A ideologia entra em campo quando se lembra da figura maravilhosa de João Saldanha, comunista, bom vivant, briguento, contandor de histórias. Um homem de muitas facetas, verdadeiro presente para quem gosta de escrever. Um personagem maravilhoso. Zagallo perde longe: tem uma voz monocórdica e, ao longo dos anos, criou o estereótipo da amarelinha, do número 13 e aquelas bobagens todas. Saldanha, em entrevistas na Europa, denunciava a tortura no Brasil. Zagallo nunca se deu mal com os militares. E, coincidência ou não, assim que assumiu, atendeu ao pedido do mais sanguinário de todos eles, convocando Dario.
Diante de Saldanha, Zagallo é apenas um patinho feio. Mas, Zagallo não entende de futebol? Seu time era cópia de Saldanha. Lógico que não. É só dar uma olhada.
TIME DE SALDANHA QUE SE DESPEDIU DAS ELIMINATÓRIAS EM 31/8/69 – FELIX, CARLOS ALBERTO, DJALMA DIAS, JOEL E RILDO, PIAZAA E GERSON; JAIR, TOSTÃO, PELÉ E EDU
TIME DE ZAGALLO QUE VENCEU A COPA EM 21 DE JUNHO DE 1970 – FELIX, CARLOS ALBERTO, BRITO, PIAZZA E EVERALDO, CLODOALDO E GERSON, JAIR, TOSTÃO, PELÉ E RIVELLINO.
Apenas oito meses depois, o time era muito diferente:
a) Tinha quatro novos jogadores: Brito, Everaldo, Clodoaldo e Rivellino
b) Piazza estava em nova posição, como zagueiro
c) O esquema era outro, com Rivellino na esquerda, compondo o meio campo.
Com Saldanha, o time era um 4-2-4, com dois pontas abertos. Um estilo de jogo que havia sido abandonado por Feola em 1958, doze anos antes. E o que fez Feola? Tirou Pepe e Canhoteiro e colocou Zagallo, para fortalecer o meio campo em um 4-3-3.
Zagallo retomou as lições de Feola e colocou Rivellino na ponta, recuado, no "seu lugar". Rivellino, um Zagallo muito melhorado.
COM Rivellino, Zagallo montou um time muito mais compacto no meio. Permitiu um rodízio no meio-campo entre Gérson e Clodoaldo – assim saiu o gol contra o Uruguai – e viu Carlos Albert Torres avançar, como na final. Compactação, recomposição, troca de posições, avanço de laterais. Tudo o que se faz hoje, Zagallo fez em 70. Como Feolha havia feito em 58.
Então, João Saldanha não ganharia a Copa? Ah, eu não sei. Não sou eu que vou dizer que, para Zagallo ser bom, Saldanha tem de ser ruim. Talvez ganhasse, por que não? O que não pode é tirar os méritos de Zagallo.

E mem transforma-lo em um santo. Zagallo foi totalmente surpreendido em 74 e só soube reagir com aquele discurso patriótico de sempre. Não é perfeito. E quem é?

Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.