Raí, Sócrates e a greve bizarra dos jogadores do São Paulo
Menon
22/02/2016 12h45
Deveriam, ao contrário do silêncio, chamar uma coletiva e dizer:
1) Nosso salário está atrasado tantos dias, mas continuaremos jogando em respeito à instituição e à torcida
OU
2) Nosso salário está atrasado tantos dias e não temos mais condições psicológicas de trabalhar. Este foi o último jogo.
OU
3) Nosso salário está atrasado tantos dias e a diretoria, mesmo sabendo disso, preferiu dar dinheiro para as torcidas organizadas no Carnaval.
OU
4) qualquer outra coisa. Não ter medo de expor sua luta, seu ponto de vista. Seria melhor, é lógico em uma situação menos vexatória do que uma derrota para o The Strongest, da Bolívia, em casa.
No programa Resenha, da ESPN, Raí disse algo sobre "mesquinhez" dos jogadores do São Paulo nessa questão. O atraso seria pequeno e a diretoria já teria se movimentado para solucionar o problema.
Pensei como seria a reação de Sócrates, irmão de Raí. Com certeza, estaria apoiando a greve. Ou, então, estaria à frente do movimento. No comando.
Raí, um grande jogador, e Sócrates, um gênio, tiveram posições diferentes sobre a vida. Raí, mais cerebral, mais contido, Sócrates mais mercurial. Raí planeja o passo a ser dado; Sócrates mergulhava no vazio.
E a grande contradição está aí: Sócrates, que era melhor tecnicamente, que encantava mais, me decepcionou mais porque dos gênios deve se cobrar mais.
Acho que ele poderia ter dado muito mais ao futebol do que a maravilha de seu futebol, do que o passe perfeito de calcanhar, do que o chute preciso após o chapéu, do que tudo o que deu.
Sócrates poderia ter sido um médico, um dirigente, um treinador, um empresário dedicado aos jogadores – e não os chupins que vicejam por aí – poderia ter sido – não teve tempo – um membro do Bom Senso, poderia ter sido tanta coisa….
Mente inquieta, não quis. Quando eu o entrevistei, pouco tempo antes da morte, disse que estava gostando de tênis e de jornalismo. Queria novos caminhos. Uma pena. O futebol perdeu muito com isso.
Raí fez o que podia. Sócrates fez menos o que podia.
Ambos, sem dúvida alguma, fizeram muito mais do que jogadores que optam pelo silêncio na hora de reivindicar o direito sagrado de todo trabalhador: receber o fruto de seu trabalho no dia correto.
Sobre o Autor
Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.