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Krüger, que ressuscitou para virar estátua. Personagem da semana

Menon

23/02/2016 06h14

O estilo rápido e direto – escolhia um caminho em direção ao gol e dele não se desviava, valeu a Dirceu Krüger o apelido de Flecha Loira. O amor da torcida ele conseguiu após ressuscitar duas vezes. Por isso, agora se transforma em uma estátua de mais de 300 quilos. De bronze. E tudo foi assim por conta das armadilhas da história oral.

O livro mais vendido de todos os tempos é um compilado de relatos orais, passados de pais para filhos, por séculos e séculos. Um grande exemplo de literatura fantástica, com cobra falante, animais convivendo em perfeita harmonia em uma enorme arca, mulher que vira estátua de sal e, é lógico, uma virgem que se torna mãe.

A delegação portuguesa que aqui aportou em 1500 fez relatos escritos de suas primeiras impressões sobre o novo país descoberto. Relatos orais contam da chegada de uma outra delegação portuguesa à Curitiba em 1969.

O comandante logo se avistou com Evangelino Costa Neves, presidente do Coritiba. E aí, ouviu-se algo parecido com:

Viemos aqui para contratar um jogador de vocês 

Qual deles?

Um loirinho bom de bola que vocês tem.

Qual loirinho?

Um polaco

Qual polaco?

Um que começa com a letra K.

E foi assim que o Vasco levou Kosilek e deixou Krüger.

Não se sabe o que Kosilek seria para o Coritiba se tivesse ficado.

Não se sabe o que Krüger seria para o Vasco se tivesse ido.

O que se sabe é o que Kosilek está na gloriosa história vascaína como um

discretíssimo coadjuvante.

O que se sabe, com pétrea certeza é no que se transformou Dirceu Krüger para o

Coritiba.

O mais amado jogador da história do clube. O flecha loira. O homem-estátua.

Estátua que será inaugurada no dia 24, amanhã, quando Krüger completa 50 anos de bons trabalhos prestados como jogador, auxiliar técnico, técnico e dirigente ao Coritiba.

Uma estátua de bronze, com 1,72m e 320 quilos, construída pelo escultor carioca Edgar Duvivier, que fez obras do mesmo tipo imortalizando Garrincha, Nílton Santos e Jairzinho. Ele é pai do ator Gregório Duvivier.

E como não amar um jogador que morreu pelo clube? Literalmente. Ou quase isso, por duas vezes. No dia 11/4/70, Dirceu Krüger completou 25 anos. Estava em campo e dali, foi para o hospital. A causa foi um choque duríssimo com o goleiro Leopoldo, do Água Branca.

Houve rompimento da alça intestinal. Krüger não morreu em campo porque instintivamente comprimiu o ferimento. No hospital, ficou por 70 dias, muitos deles, inconsciente. A torcida do Coxa fez romarias para visitar e rezar por seu craque. Mas não só ela. Lauro Rego Barros, presidente do Furacão, grande rival, mandou rezar uma missa por Krüger.

Por duas vezes, ele recebeu extrema unção. E resistiu. Saiu do hospital (foto cedida pelo Arquivo GRPcom), recuperou-se e em novembro, em uma excursão à Romênia, voltou a marcar. Mas foi um retorno efêmero.

Precisava jogar com uma cinta, que protegia o local acidentado. Em 1975, acidentalmente, um adversário bateu a mão no local e ele sentiu as mesmas dores de cinco anos passados. Os remédios que tomava, prejudicavam a visão. Percebeu, então, que, continuar em campo, seria uma espécie de desafio constante à morte. Em fevereiro de 1976, pendurou as chuteiras após uma vitória por 1 a 0. Em um Atletiba. Sem um jogo de despedida. Apenas uma volta olímpica

Tinha 30 anos e havia marcado 58 gols em 252 jogos. Deixou a carreira sem nunca ter sido expulso. Imediatamente passou a ser auxiliar de Jorge Vieira. Dirigiu o time por 201 partidas e outras 185 como interino. Estava ao lado de Enio Andrade, como auxiliar técnico no título brasileiro de 1985.

Foi ele que lançou Alex, o mais técnico jogador nascido no Coritiba. E é ele quem dá o nome ao alojamento dos garotos da base. É o diretor dessa área.

Merece ou não uma estátua. E esta foi construída com suor e sangue da torcida, através de uma ação de crowdfunding – vaquinha virtual – lançada em 19 de novembro do ano passado pelo torcedor Gabriel Zornig, conselheiro do clube.

Verdade seja dita, a torcida do Coxa não aderiu com o entusiasmo que Kruger

merecia. Faltando 20 dias para o final do processo de arrecadação, apenas 23%

havia sido arrecadado. Somente R$ 33.284, 00 dos R$ 140 mil previstos.

Foi então que Alceni Guerra, dirigente do Coxa e ex-ministro do Presidente Collor disse que bancaria o final do projeto.

A torcida, desafiada, abriu as burras e, em dez dias choveu dinheiro sobre a vaquinha. A meta dos os R$ 140 mil foi batida. Tinha de ser assim. Um ídolo popular tem de ser homenageado por seu povo.

"Conseguimos R$ 190 mil, que servirá para pagar a estátua e para construirmos

uma praça no estádio para receber a estátua. Será uma revitalização do espaço

público", diz Zornig.

O projeto ganhou página no facebook – Estátua de Krüger – lançou camisa própria para presentear apoiadores e ainda fez um DVD com extensa entrevista com o ídolo, que viveu, morreu e reviveu Coxa.

Só deixou o verde e branco para adotar o bronze e ser imortalizado por ele.

Um ídolo popular, homenageado por seu povo.

Talvez seja a torcida e não Krüger o personagem da semana.

Nota – O texto contou com ajuda inestimável de Marcos Xavier

 

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Sobre o Autor

Meu nome é Luis Augusto Símon e ganhei o apelido de Menon, ainda no antigo ginásio, em Aguaí. Sou engenheiro que nunca buscou o diploma e jornalista tardio. Também sou a prova viva que futebol não se aprende na escola, pois joguei diariamente, dos cinco aos 15 anos e nunca fui o penúltimo a ser escolhido no par ou ímpar.Aqui, no UOL, vou dar seguimento a uma carreira que se iniciou em 1988. com passagens pelo Trivela, Agora, Jornal da Tarde entre outros.


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